The sadness is mine.

Tenho uma tristeza redonda mas incontornável. Carrego-a. A maior parte do tempo carrega-me ela a mim. Tenho-lhe, por isso, a estima do bicho abraçado pela própria toca. Não devemos desprezar o que nos acolhe nos braços sem reservas. Eu não penso se gosto dela, não é equacionável. Vejo a forma como se mantém intacta pelas estações, como escarnece das árvores que se renovam. A minha tristeza não se atira ao chão como as folhas, não se despega da pele quando tomo banho – antes me turva a água como me turva os olhos. Soube-lhe o travo desde o início, veio traindo a saliva ao primeiro beijo. Às vezes a tristeza passa dos meus fluidos para os teus e fecunda-te. É mais perigosa que o teu esperma. Não te enganes com os meus beijos, repara antes nos meus olhos. Tenho uma tristeza fotogénica. Uma amiga viu-me o rosto impresso e disse é este o teu olhar triste. É uma tristeza invejável. Mais verdadeira que muitas entregas de corpos na imprecisão da madrugada.


The sadness is mine
It’s why you're not healing me
[Ryan Adams]